Eu era garoto quando os Mamonas Assassinas estouraram. Era jovem, mas não o bastante para não me lembrar do fenômeno em que eles se tornaram. Se a sina dos nascidos nos anos 80 e 90 foi jamais ter presenciado um Gigante do Rock enquanto ele caminhava pela Terra, os Mamonas Assassinas nos deram uma pequena demonstração do que seria ter vivido na época em que Beatles ou Jimi Hendrix lançavam suas primeiras canções e ganhavam o mundo.
Eu vi esse fenômeno. E ouvi com meus próprios ouvidos.
Comprei o disco dos peitões na capa. Decorei todas as letras e acompanhei enquanto eles, contra todas as leis da física, apareciam na Globo e no SBT no mesmo fim de semana.
E também me abalei quando eles se foram, com a mesma surpresa com que vieram. "Deus dá e Deus tira", foi o que disse Benjamin Button.
Depois que o fenômeno dos Mamonas Assassinas passou, raras foram as vezes em que peguei o disco dos peitos para ouvi-lo de novo. Parecia que a mágica tinha se esvaído com a morte precoce do grupo. No começo eu pensava que era só eu que tinha amadurecido e não mais era afetado pela loucura jovial daqueles músicos de Guarulhos.
Mas não era só eu. Eles não tocavam mais nas rádios nem seus clipes eram mostrados na TV. Afinal, o que tinha acontecido? O avião parece que tinha não só levado nossos antigos heróis, mas apagado a memória do público.
Há quem diga que eles não eram comerciais, como não poderia jamais ser comercial alguém que imita o sotaque nordestino com o mesmo escracho com que faz o som do peido. Que fala de Gay e de chifre na testa sem a menor vergonha ou preconceito. Que só faz declaração de amor quando esta permite "cortar os cabelos do suvaco" da mulher amada. Que ia do nojento ao sexual explícito na mesma estrofe. Que desafiava a lógica e imitava o Biafra e o Luiz Carlos no meio de um Rock pesadíssimo.
Há bandas bem humoradas aos montes por aí e nenhuma delas é lá muito comercial. Mas como foi que os Mamonas Assassinas chegaram onde chegaram?
Para mim eles só comprovam aquela velha e sábia teoria: a de que nada faz sentido.
Quando eram sérios e, portanto "comerciais", ninguém dava a mínima. Quando fizeram tudo o que era o oposto do esperado pela indústria de música, chegaram no topo quase instantaneamente. Depois que morreram, ao invés de se tornarem ícones da nossa história, foram ignorados.
O destino é implacável.
Voltei a escutar os Mamonas no ano passado, enquanto estava na Austrália e buscava as mais variadas formas de me conectar com o Brasil para matar a saudade de casa. Foram quase 20 anos de intervalo. Antes eu era um garoto inocente que seguia a onda e ria de tudo. Agora eu era um velho endurecido ciente de que nem tudo é tão colorido quanto a embalagem promete e doutrinado nos Caminhos do Rock por Led Zeppelin e ACDC. Agora eu iria ver do que os Mamonas eram feitos de verdade.
E ri. Exatamente como quando eu uma criança.
Chorei de rir.
Me peguei percebendo críticas as quais eu era ingênuo demais para compreender ("Abra sua mente, gay também é gente"). Descobri sentido em versos que antes só tinham a sonoridade engraçada ("feijão com jabá a desgraçada não quer compartilhar"). Compreendi a piada com o português em Vira-Vira. Viajei em solos que antes passavam despercebidos e reconheci influências de bandas que eu também admiro. Dos Red Hot Chili Peppers em 1406 ao Metallica em Debil Metal. Também identifiquei plágios, é verdade, e entendi finalmente porque alguns dos meus amigos mais velhos não foram enfeitiçados pelos Mamonas como eu fui.
Acho que tive sorte.
Pude conhecer dois Mamonas Assassinas. Conheci o humor e o ritmo deles com a ingenuidade infantil e conheci o lado musical e o talento que eles tinham para fazer música de verdade, por trás de toda o escárnio e toda a propaganda. Os dois Mamonas me fizeram rir, curtir a vida e reconhecer que, de fato, eles eram únicos. Tinham alguma missão cósmica misteriosa aqui e então fizeram o que tinham de fazer e se foram.
Como disse acima, nada faz sentido e o mundo - principalmente o mundo do Rock - está cheio de mistérios e não poder explicá-los é algo que os tornam especiais.
Mas, ainda assim, lamento o fato deles não terem um lugar especial na música brasileira que não fosse o de "um fenômeno passageiro". Eles eram muito mais que isso ;)
Eu vi esse fenômeno. E ouvi com meus próprios ouvidos.
Comprei o disco dos peitões na capa. Decorei todas as letras e acompanhei enquanto eles, contra todas as leis da física, apareciam na Globo e no SBT no mesmo fim de semana.
E também me abalei quando eles se foram, com a mesma surpresa com que vieram. "Deus dá e Deus tira", foi o que disse Benjamin Button.
Depois que o fenômeno dos Mamonas Assassinas passou, raras foram as vezes em que peguei o disco dos peitos para ouvi-lo de novo. Parecia que a mágica tinha se esvaído com a morte precoce do grupo. No começo eu pensava que era só eu que tinha amadurecido e não mais era afetado pela loucura jovial daqueles músicos de Guarulhos.
Mas não era só eu. Eles não tocavam mais nas rádios nem seus clipes eram mostrados na TV. Afinal, o que tinha acontecido? O avião parece que tinha não só levado nossos antigos heróis, mas apagado a memória do público.
Há quem diga que eles não eram comerciais, como não poderia jamais ser comercial alguém que imita o sotaque nordestino com o mesmo escracho com que faz o som do peido. Que fala de Gay e de chifre na testa sem a menor vergonha ou preconceito. Que só faz declaração de amor quando esta permite "cortar os cabelos do suvaco" da mulher amada. Que ia do nojento ao sexual explícito na mesma estrofe. Que desafiava a lógica e imitava o Biafra e o Luiz Carlos no meio de um Rock pesadíssimo.
Há bandas bem humoradas aos montes por aí e nenhuma delas é lá muito comercial. Mas como foi que os Mamonas Assassinas chegaram onde chegaram?
Para mim eles só comprovam aquela velha e sábia teoria: a de que nada faz sentido.
Quando eram sérios e, portanto "comerciais", ninguém dava a mínima. Quando fizeram tudo o que era o oposto do esperado pela indústria de música, chegaram no topo quase instantaneamente. Depois que morreram, ao invés de se tornarem ícones da nossa história, foram ignorados.
O destino é implacável.
Voltei a escutar os Mamonas no ano passado, enquanto estava na Austrália e buscava as mais variadas formas de me conectar com o Brasil para matar a saudade de casa. Foram quase 20 anos de intervalo. Antes eu era um garoto inocente que seguia a onda e ria de tudo. Agora eu era um velho endurecido ciente de que nem tudo é tão colorido quanto a embalagem promete e doutrinado nos Caminhos do Rock por Led Zeppelin e ACDC. Agora eu iria ver do que os Mamonas eram feitos de verdade.
E ri. Exatamente como quando eu uma criança.
Chorei de rir.
Me peguei percebendo críticas as quais eu era ingênuo demais para compreender ("Abra sua mente, gay também é gente"). Descobri sentido em versos que antes só tinham a sonoridade engraçada ("feijão com jabá a desgraçada não quer compartilhar"). Compreendi a piada com o português em Vira-Vira. Viajei em solos que antes passavam despercebidos e reconheci influências de bandas que eu também admiro. Dos Red Hot Chili Peppers em 1406 ao Metallica em Debil Metal. Também identifiquei plágios, é verdade, e entendi finalmente porque alguns dos meus amigos mais velhos não foram enfeitiçados pelos Mamonas como eu fui.
Acho que tive sorte.
Pude conhecer dois Mamonas Assassinas. Conheci o humor e o ritmo deles com a ingenuidade infantil e conheci o lado musical e o talento que eles tinham para fazer música de verdade, por trás de toda o escárnio e toda a propaganda. Os dois Mamonas me fizeram rir, curtir a vida e reconhecer que, de fato, eles eram únicos. Tinham alguma missão cósmica misteriosa aqui e então fizeram o que tinham de fazer e se foram.
Como disse acima, nada faz sentido e o mundo - principalmente o mundo do Rock - está cheio de mistérios e não poder explicá-los é algo que os tornam especiais.
Mas, ainda assim, lamento o fato deles não terem um lugar especial na música brasileira que não fosse o de "um fenômeno passageiro". Eles eram muito mais que isso ;)
Comentários
Estou deixando aqui um link de um canal que eu sigo no YouTube que fez uma homenagem a tragetória deles juntando algumas entrevistas e o trabalho ficou bem interessante.
Nostalgia - Mamonas Assassinas