A Menina Dança

"Acabou Chorare", um disco único em todos os sentidos

Quem aprecia Rock nacional provavelmente tem na figura de Pepeu Gomes uma das representações máximas no talento e feeling para a guitarra. Já quem aprecia MPB pode reconhecer em Moraes Moreira a fonte das mais icônicas letras e poesias da música brasileira. Não é por menos, então, que a dupla, acompanhada de outros músicos de talento absurdo como Baby Consuelo, Paulinho Boca de Cantor e Jorginho Gomes formaram, no final da década de 60, uma das mais importantes bandas da música brasileira, os Novos Baianos.

Novos Baianos. Uma lenda há mais de 40 anos. Foto: Divulgação


Engraçado perceber que hoje, mais de 40 anós após o auge da banda, seu disco "Acabou Chorare" continua atual. Lançado em 1972, o álbum está em diversas listas de melhores álbuns da música brasileira, mas não é necessário o aval de nenhum crítico para perceber como se trata de um trabalho único. Uma audição é suficiente para atestar que se está diante de uma relíquea, uma obra-prima, uma magia misteriosa e poderosa conjurada e transformada em LP. O trabalho reúne canções que hoje são lendárias como Brasil Pandeiro, Preta Pretinha e Acabou Chorare com um lado B igualmente impressionante do ponto de vista técnico e emocionante ao se analisar letras e instrumentos que se recusam à seguir uma única vertente musical, mas se satisfazem ao misturar o Samba com Rock, MP3 com baião e tudo de bom que havia na música até então.

Impossível não comprar a alegria que o disco vendo em canções como Tinindo Trincando e Besta é Tu. Improvável não sentir orgulho do nosso ritmo nacional na abertura Brasil Pandeiro. Difícil não admirar os solos de guitarra de Pepeu e o violão de Moraes Moreira.

Talvez mais difícil que isso tudo seja ficar indiferente à voz de Baby Consuelo. A cantora, dona de uma afinação poderosa e uma voz deliciosamente carismática, com direito à uma irresistível pitada de sotaque baiano, domina os microfones em diversos temas e neles nos faz viajar, dançar e sonhar como se isso fosse a coisa mais natural do mundo.



Em A Menina Dança, por exemplo, parte do lado B do álbum, a cantora descreve com delicadeza e muita beleza o simples ato de dançar. Com a poesia em primeira pessoa fica impossível não associar a bailarina com a própria cantora, dada à suavidade com que ela incorpora a narradora e nos entrega um ritmo maravilhoso e contagiante. Ao fundo, a banda propõe à cantora uma base perfeita com o violão dedilhado com maestria e percussão empolgante. A cereja do bolo é a guitarra de Pepeu que permanece durante toda a canção numa loucura contida, até que se solta nos minutos finais para um solo frenético e delirante.

É o tipo de música pela qual nos apaixonamos na primeira audição. Trilha sonora perfeita para uma viagem de carro num dia ensolarado, de preferência para o Rio de Janeiro, em direção à terra sagrada e maravilhosa onde a banda criou diversos álbuns e canções, incluindo "Acabou Chorare". A Menina Dança é, como tantas outras faixas do álbum um convite à apreciar as belezas da vida não importa qual seja a situação. Da observação da abelha voando em um dia corriqueiro na faixa título até a bailarina mística que dança e hipnotiza quem quer que assista, "Acabou Chorare" é pra literalmente fazer chorar de emoção quando se ouve e de saudade assim que acaba ;)

"Por que não viver esse mundo?
Se não há outro mundo?"

(Besta É Tu, 8ª faixa do disco Acabou Chorare. Autoria: Galvão, Gomes, Moreira)

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