Samba Makossa

Anos dourados e o passado não mais tão sombrio

Todos nós temos um pouco do chamado "passado negro". Não é tudo referente ao nosso histórico que temos, digamos, orgulho de expor. Mudamos tanto ao longo dos anos que algumas escolhas ou situações passadas nos soam "estranhas", como se fosse outra pessoa que tivesse agido naquela ocasião. Isso acontece muito em termos musicais. Conforme conhecemos mais músicas e bandas excepcionais, passamos a deixar de lado alguns grupos que talvez não atinjam os requisitos mais "refinados" que buscamos. Em alguns casos passamos até a renegar tais bandas como se nunca as tivéssemos conhecido, varrendo-as para debaixo do tal "passado negro" de onde nunca tornamos à vê-las, a não ser com uma patética vergonha nos olhos. De todas as bandas que sofrem desse mal, Charlie Brown Jr. talvez seja a mais injustiçada. Diversos conflitos internos, troca de integrantes e estratégias comerciais duvidosas fizeram com que a banda acabasse rotulada como "som para adolescentes". Talvez isso seja verdade hoje. Mas verdade mesmo é que a banda ensinou muitos adolescentes de outrora lições sobre o Rock N'Roll, liberdade de expressão e movimentação social. Prova da competência dos caras é essa versão de Samba Makossa, presente no disco "Acústico MTV" de 2003. Segue a letra:




Samba Makossa
(Science)

Minha família, quer tudo como quem não quer nada
Mas toma uma de assalto quando chega na parada

Samba maioral
Onde é que você se meteu
Antes de chegar na roda, meu irmão?
Eu disse samba maioral
Onde é que você se meteu
Antes de chegar na roda, sangue bom?

A responsabilidade de tocar o seu pandeiro
É a responsabilidade de você manter-se inteiro
É de você manter-se inteiro, inteiro

Por isso chegou a hora
Dessa roda começar
Samba Makossa da pesada
Vamos todos celebrar

Cerebral
É assim que tem que ser
Maioral
Porque é assim que é
Mão na cabeça e o skate no pé
Samba Makossa tem hora marcada
É da quebrada, é da quebrada

Samba maioral
Onde é que você se meteu
Antes de chegar na roda, sangue bom?

A responsabilidade de tocar o seu pandeiro
É a responsabilidade de você manter-se inteiro
É, é de você manter-se inteiro

Por isso chegou a hora
Dessa roda começar
Samba Makossa da pesada
Vamos todos celebrar

Cerebral
É assim que tem que ser
Maioral
Porque é assim que é
Mão na cabeça e skate no pé
Samba Makossa tem hora marcada
É da pesada, é da pesada
É da pesada, é da pesada
No sapatinho...

Modernizar o passado
É uma revolução musical
Cadê as notas que estavam aqui?
Não preciso delas
Basta que soe bem aos ouvidos
Viva Zapata! Viva Sandino! Viva Zumbi!
Antônio Conselheiro
Todos os Panteras Negras
Lampião, sua imagem semelhança
Eu tenho certeza, assim como Sabotagem,
Chico Science, eles também cantaram um dia

Samba, samba, samba, samba, samba
Samba, samba, samba, samba, samba, samba, samba
Samba, samba, samba, samba, samba
Samba, samba, sambou
Eu disse samba, samba, samba, samba, samba
Samba, samba, samba, samba, samba
Samba, samba...

Maioral
É assim que tem que ser
Maioral
Porque é assim que é
Mão na cabeça e skate no pé
Samba Makossa tem hora marcada
É da pesada
É da quebrada, é da quebrada...

Vamos à andança...

O disco "Acústico MTV" do Charlie Brown Jr. pode ser considerado um marco na carreira do grupo, principalmente por ter sido um dos últimos em sua formação clássica. Até ali o grupo vivia seus anos dourados com canções marcantes, letras de atitude pessoal ou cunho social, além da parte instrumental competentíssima. Com a saída de Champignon e Pelado, dois dos membros originais da banda, o grupo entrou numa crise existencial que não foi curada nem com o retorno dos músicos alguns anos depois. A sensação é de que o público cresceu, mas o Charlie Brown repetiu de ano. A banda santista ainda tem lá suas canções nas rádios e novelas e ainda é capaz de fazer jovens se inspirarem a curtirem mais a vida, mas de longe seu som não é o mesmo daquele longínquo 2003. Naquele ano, o disco acústico mostrava o ápice do talento do Charlie Brown, com versões ao vivo dos maiores hits da banda executadas com maestria e participações mais que especiais de Negra Li, Marcelo Nova e Marcelo D2. Este último, antigo integrante do Planet Hemp e um dos grandes nomes da música brasileira atual ajuda Chorão e sua trupe a construir uma sensacional versão de Samba Makossa, canção de Chico Science e Nação Zumbi, lançada em 1994. Como é raro acontecer - e só acontece com bandas realmente excelentes - a regravação ficou melhor que a original e é um dos pontos máximos não só do disco, como da carreira do Charlie Brown Jr. O dueto enfurecido entre D2 e Chorão é inspirador e os dois alternam as estrofes com entrosamento de Romário e Bebeto na Copa de 94. O balanço da canção é outro ponto alto, com um violão rápido e instigante fazendo o riff ao fundo. O toque de mestre vem de outro convidado especial, o gaitista Uruca de Santos que, além de uma introdução revigorante na harmônica, ainda solta um solo enfurecido, avassalador no clímax da música. Ouso dizer que esse é um dos melhores solos de gaita cujos meus ouvidos tiveram o deleite de degustar. Os sopros são tão rápidos e alternam tantos agudos e graves que nos faz pensar que Uruca dos Santos tem um pulmão à mais - um caso sério de estudo científico. Antes do solo frenético, porém, um trecho anterior da gaita chama um teclado tão viajante que nos faz relevar o fato de estarem usando um teclado num show acústico. Enquanto o teclado solta suas notas hipnóticas, Marcelo D2 declama Monólogo ao Pé do Ouvido, outra canção marcante do gênio Chico Science. Nela, Chico homenageava as antigas lendas do nordeste tão importantes pra nossa cultura artística. Na versão do Charlie Brown Jr., além desses antigos nomes, o próprio Chico é incluído no próprio recital, juntamente com Sabotagem, rapper assassinado naquele mesmo ano. O trecho é tão bonito que vale a pena ser citado na íntegra em versos como foi concebido e atualizado:

"Modernizar o passado
É uma revolução musical
Cadê as notas que estavam aqui?
Não preciso delas
Basta que soe bem aos ouvidos
Viva Zapata! Viva Sandino! Viva Zumbi!
Antônio Conselheiro
Todos os Panteras Negras
Lampião, sua imagem semelhança
Eu tenho certeza, assim como Sabotagem,
Chico Science, eles também cantaram um dia"


Após a belíssima homenagem, a canção usa os versos "Samba, samba, samba" pra ganhar força e aceleração até explodir no grandioso refrão, já devidamente impregnado na mente: "Cerebral, é assim que tem que ser Maioral! Pois é assim que é, mão na cabeça e um skate no pé. Samba Makossa tem hora marcada!". Um detalhe interessante é a troca do verso, antes cantado por Science "Bom da cabeça e um foguete no pé", agora devidamente atualizado para entrar no espírito da banda que reconstruiu a obra. Chico Science sentiria-se honrado, sem dúvida. E nós, ouvintes e fãs, ficamos felizes como nunca ao ver uma banda ótima em seu auge criativo, junto com seus convidados incríveis ressuscitando uma canção de forma tão emocionante ;)

Nunca ouviu?

Modernize seu passado. Escute:

Comentários

Paula R. Alvarez disse…
Verdade! Com o tempo, mudamos o gosto para praticamente tudo! Comida, música, livros, filmes, roupas, pessoas, enfim...
Charlie Brown, para mim, nunca mudou! Gosto bastante, tantos das antigas como das novas músicas, apesar de toda a turbulência na banda!
Esse CD concordo, é um dos melhores, e o único que tenho deles! Gosto bastante, as versões acústicas ficaram divinas! rs
Samba Makossa, também é uma das minhas preferidas!

beijãozão *
Danusa disse…
"A sensação é de que o público cresceu, mas o Charlie Brown repetiu de ano."

Bem isso...

Andarilho disse…
É isso aí Paulinha, a gente ta sempre mudando constantemente, por isso que acabamos deixando de lado algumas bandas e nos interessando por outras. Que bom q vc ainda curte o Charlie, eu mesmo fico só com a fase até o acústico, mas respeito os caras ainda. Valeu pelo comentário!

Valeu pelo comentário tambem, Danusinha! ;)

Bjs!
Paula R. Alvarez disse…
Ah não acompanho como antes, nem baixo músicas mais...mas não troco de rádio quando toca hahahaha


:)

acompanhando aqui...bacanudo seu blog!!!!!! Escreve bem hein?!

Beijãozão*
Marcos didicius disse…
Parabéns pela crítica, descreveu a musica de maneira genial. Tive compartilhar com meus amigos!
Só discordo da idéia de o CBJr ser rotulado como uma banda de adolecentes ou ter "repetido de ano". Quando os integrantes originais sairam da banda ela perdeu muito em qualidade instrumental (musicos da qualidade deles não costuma ser fácil de achar no mercado) e teve que se reiventar o que, na minha opinião, Chorão o fez com maestria, tanto que eles tiveram varios hits e estourando nas radios e um álbum premiado com um grammy latino.
Parabens pelo blog, vou frequentalo com mais frequência.
Abraço!!
Felipe Andarilho disse…
Oi Marcus, tudo bem? Com ctz, caras como o Pelado e Champignon são dos melhores músicos do Brasil, mas pelo que ouvi depois do disco Acústico da MTV, o CBJ nunca mais apresentou uma canção como daquelas antigas. As músicas se tornaram hits, mas não tinham aquela mesma aura de atitude e malandragem. Eram músicas muito mais adoslecentes... Mas enfim, respeito sua opiniao e até admiro o fã que não abandona a banda. Eu sou assim com Red Hot por exemplo, heheheh.. Abração obrigado pela visita!
Marcos didicius disse…
Na verdade você ta mais que certo, é que sou fã né rsr, assim que li respondi no impulso, quando me dei conta percebi que o álbum que eu ainda escutava do início ao fim erra o MTV rsrsrs.
Também gosto muito do Red Hot, e sempre tive uma dúvida a respeito (li a matéria que você postou sobre eles, pensei que ia ter algo sobre, mas não tinha). Você acha que a saída do John Frusciante, deixou meio que um vácuo, ou é só nostalgia minha mesmo?
Andarilho disse…
Falae Marcão!
Realmente cara, o Jhon Frusciante faz falta. Sabe, achei o disco "I'm With You" muito bom mesmo. Curti várias músicas, mas fica um vacuo sim, falta os solos enfurecidos do cara. O guitar novo, o Josh Klingopher, o cara manda bem, segura a base, mas falta aquilo do Frusciante de meter uns solos absurdos... Mas tamo ai quem sabe ele nao volta pra banda pela terceira vez, hahaha