Virando a Página

E voltando a ser um

Faz tempo que essa canção vem martelando minha cabeça, aparecendo de vez em quando na rádio que escuto, ou no meu player em Shuffle Mode que, para o nosso bem, sempre traz coisas diferentes ou há algum tempo esquecidas. Magicamente eu mais uma vez percebo que não tinha postado sobre ela ainda simplesmente por que não era a hora. A hora é agora. Afinal, é quando eu, mais do que os meus leitores, preciso da mensagem aqui contida. Eu falaria da versão original do Bob Seger, se o Metallica não tivesse conseguido melhorá-la ainda mais. E faria um Lado AB se a mensagem da música não fosse mais importante do que a análise crua das duas versões. Saiu no "Garage Inc", o disco de covers da banda, lançado em 1988. Segue a letra:




Turn the Page
(Seger)

On a long and lonesome highway
East of Omaha
You can listen to the engine
moanin' out his one note song
You can think about the woman
or the girl you knew the night before
But your thoughts will soon be wandering
the way they always do
When you're ridin' sixteen hours
and there's nothin' much to do
And you don't feel much like ridin',
you just wish the trip was through

Here I am
On the road again
There I am
Up on the stage
Here I go
Playin' star again
There I go
Turn the page

Well you walk into a restaurant,
strung out from the road
And you feel the eyes upon you
as you're shakin' off the cold
You pretend it doesn't bother you

but you just want to explode
Most times you can't hear 'em talk,
other times you can
All the same old cliches,
"Is that a woman or a man?"
And you always seem outnumbered,
you don't dare make a stand

Here I am
On the road again
There I am
Up on the stage
Here I go
Playin' star again
There I go
Turn the page

Out there in the spotlight
you're a million miles away
Every ounce of energy
you try to give away
As the sweat pours out your body
like the music that you play
Later in the evening
as you lie awake in bed
With the echoes from the amplifiers
ringin' in your head
You smoke the day's last cigarette,
rememberin' what she said

Here I am
On the road again
There I am
Up on the stage
Here I go
Playin' star again
There I go
Turn the page

Here I am
On the road again
There I am
Up on the stage
Here I go
Playin' star again
There I go
There I go

Dê o play e comece a viagem:



Vamos à andança...

Virar a página. Esse é o título e a chave da obra. É também o sermão que a maioria dos bons amigos nos dá quando ficamos presos ao passado por alguma razão. Como a maioria dos bons conselhos, tendemos à ignorá-los, certos de que ninguém realmente compreende aquela ferida como nós mesmos e que a coisa mais natural a se fazer é continuar remoendo a cicatriz achando que ela pode ser apagada. No final, é claro, tudo o que conseguiremos é abrir a fenda e fazer a dor latejar com mais força do que nunca.

Depois, muito tempo depois, quando a ferida não passará de uma cicatriz orgulhosa de uma antiga batalha travada, reconheceremos que aquele velho sermão, o tal de "vire a página" era a melhor coisa que poderíamos ter feito e que os nossos amigos não eram tão insensíveis no fim das contas. Na verdade eles sabiam, já tinham passado por aquilo, mas nós, em nossa arrogância tola não podíamos aprender da forma mais simples. Ao contrário, tinhamos que descer até o fundo do poço pra finalmente olhar pra cima e perceber que queríamos estar lá fora.

Bob Seger foi um desses que, precisou passar voluntariamente pela melancolia do deserto pra perceber que estava no oásis alegre antes mesmo de ter saído em jornada. Sua canção é resultado deste momento de elucidação e os versos, que então foram regravados com mais peso pelo Metallica servem para nós, ouvintes, como uma inspiração - a história de alguém que já viveu o mesmo e, melhor do que um conselho, nos oferece um exemplo.

James Hetfield diz com a agressividade costumeira de quem precisa dar um empurrão para que o ouvinte preste atenção:

"Aqui estou eu, na estrada de novo
Ali estou em cima do palco
Aqui estou eu, bancando a estrela de novo
Aí vou eu, virando a página"



Alguns meses antes de ir para a Austrália uma amiga fez uma profecia que se revelou dolorosamente verdadeira: "Você nunca mais será inteiro. Quando estiver lá, vai sentir falta daqui. E quando estiver aqui vai sentir falta de lá".

Hoje completa-se 1 ano que voltei pra casa e raros foram os dias em que não me lembrei dessa observação de minha amiga. Na época em que ouvi o que ela disse encarei aquilo com a alegria confiante e ingênua de um jovem que sai pra explorar o mundo. Durante este ano, percebi o verdadeiro pelo daquelas palavras. Como aconteceu com Gabriel, o Pensador, "Eu fui caindo na real, vendo como o Brasa tava em brasa, tava mal". Era difícil não ser inteiro. Eu realmente sentia falta de casa. Só não sabia se a casa era aqui ou lá. Não sabia onde queria estar, não sabia se tinha feito a coisa certa e doía me afastar cada vez mais das memórias de um lugar que agora me parecia perfeito, mas que quando ali vivi, sabia bem que não era assim. Eu mesmo tinha escrito sobre isso, mas tinha convenientemente me esquecido.

E depois desse tempo todo, decidi que queria ser inteiro de novo. Estava cansado da metade. Lembrei-me do Metallica e de Bob Seger e finalmente virei a página.

Instantaneamente o peso das costas sumiu. Não sei pra onde ele foi. Não sei algum anjo levou embora ou se ele nunca tinha existido à não ser em minha mente, mas o que importa é que eu finalmente era um de novo e não mais meio.

Sócrates, o Guerreiro Pacífico já tinha dito tantas vezes que eu decorei: "o passado já foi e não pode ser alterado, o futuro nunca será como esperamos, o guerreiro não vive no passado, nem no futuro. O guerreiro está aqui e agora". Suas palavras ganharam ainda mais força depois de minha decisão.

A partir de agora seria apenas o presente. Uma página virada e um sorriso no rosto ;)

Comentários

Leo Silveira disse…
5 anos depois da sua postagem meu caro, estou aqui. Texto legal, embora o disco em questão não é de 88 mas sim de 98. Pra mim que conheci Metallica na primeira metade dos anos 1980, acho essa fase de Load ao Garage Inc muito bacana e tão interessante quanto a trinca inicial da banda Kill/Ride/Master. Depois pouco ou nada me chamou a atenção. Quanto a Turn, embora tenha sido um cover extremamente bem feito e construído, Bob foi genial e feliz na composição, o que me faz ter um apreço maior pela versão de 1973. Abraços.