Sobre trabalho, força de vontade e esperança
Mais um ano que acaba e deixa saudades por tantas aventuras, viagens e músicas que conhecemos e compartilhamos. 2014 foi o ano em que voltei pra casa depois de uma grande aventura ao redor do mundo, por isso gostaria de encerrá-lo com essa canção que conheci lá, no lado oposto do globo, e me acompanha até hoje quando quero relembrar dos melhores e piores momentos vividos ali. É da banda Of Monster and Men e foi lançada em 2011 em seu álbum de estréia, "My Head is an Animal". Segue a letra:
Little Talks
(Hilmarsdóttir/Þórhallsson)
Hey! Hey! Hey!
I don't like walking around this old and empty house
So hold my hand, I'll walk with you, my dear
The stairs creak as you sleep, it's keeping me awake
It's the house telling you to close your eyes
Somedays I can't even trust myself
It's killing me to see you this way
'Cause though the truth may vary
This ship will carry our bodies safe to shore
Hey! Hey! Hey!
There's an old voice in my head that's holding me back
Well, tell her that I miss our little talks
Soon it will be over and burried with our past
We used to play outside when we were young
And full of life and full of love
Somedays I don't know if I am wrong or right
Your mind is playing tricks on you, my dear
'Cause though the truth may vary
This ship will carry our bodies safe to shore
Hey!
Don't listen to a word I say
Hey!
The screams all sound the same
Hey!
Though the truth may vary
This ship will carry our bodies safe to shore
You're gone, gone, gone away; I watched you disappear
All that's left is a ghost of you
Now we're torn, torn, torn apart, there's nothing we can do
Just let me go; we'll meet again soon
Now wait, wait, wait for me, please hang around
I'll see you when I fall asleep
Hey!
Don't listen to a word I say
Hey!
The screams all sound the same
Hey!
Though the truth may vary
This ship will carry our bodies safe to shore
Don't listen to a word I say
Hey!
The screams all sound the same
Hey!
Though the truth may vary
This ship will carry our bodies safe to shore
Though the truth may vary
This ship will carry our bodies safe to shore
Though the truth may vary
This ship will carry our bodies safe to shore
Dê o play e comece a viagem:
Vamos à andança...
Arrumar emprego em outro país não é uma tarefa fácil. Nos filmes que vemos parece tão simples chegar em outra cidade, outra cultura e ser logo absorvido pelo povo local graças ao seu charme irresistível. Infelizmente, na vida real, como sempre a coisa é diferente, um tanto menos romântica, mas nem por isso menos emocionante. O fato é que ninguém está preocupado com o seu sorriso e o seu bom humor. O que querem mesmo é alguém que trabalhe bastante, ganhe e pouco e reclame nada. Na verdade, mesmo aceitando tudo isso ainda é difícil. Candidatos são o que não faltam. Depois de muito tempo vivendo por lá e analisando os casos dos meus colegas, descobri que o emprego em outro país depende 50% de contatos, 50% de sorte. Nada mais. As habilidades e o fato de falar bem o idioma local são, por incrível que pareça, nada relevantes. Vale mais a pena ter um amigo que te indique na cozinha do bar do que ter uma boa noção de culinária. Vale mais a pena buscar o trabalho bem no dia que o chefe está desesperadamente precisando de um faxineiro do que mostrar que seu inglês é de nível profissional num dia normal. Reparei que para quem vem de um país de língua inglesa nativa a coisa é bem mais fácil. Afinal, o melhor jeito de oferecer a cara de pau e sorriso sedutor ao patrão é falando a mesma língua que ele. Para nós, órfãos de Portugual e seu bonito idioma, resta contar com a estatística acima: contatos e sorte. Conto sobre tudo isso para que seja possível compreender o quão difícil foi arrumar meu primeiro emprego fixo de garçom na Austrália e o quanto tive que agradecer à Deus por isso. Levei mais ou menos dois meses fazendo pequenos bicos para ser chamado para uma entrevista de garçom num café em uma praia distante. Na ocasião, o indonésio dono do estabelecimento me perguntou sobre experiência e estudos. Disse que vinha fazendo uns bicos na área, o que era verdade e que tinha estudado marketing no Brasil, o que julguei ser relevante. Não sei se ele acreditou ou não ou o que ele viu em mim ou não, mas gosto de pensar que ele sentiu pena. Penso se ele não me olhou nos olhos e viu, por trás da minha máscara colorida, um coitado imigrante desesperado por trabalho. Gosto de pensar assim pois então posso cluncluir que ainda há pena no mundo. As pessoas ainda oferecem ajuda aos outros por compaixão e o fazem sem esperar nada em troca. Não sei porque ele me contratou, mas foi o que ele fez. Trabalhei ali por quase tanto tempo quando meus empregos no Brasil e cada dia que o fiz, tentei fazer com o máximo de alegria. Tinha que compensar a arriscada escolha do chefe. Não é fácil dar uma chance a um cara que você nunca viu na vida, vindo do terceiro mundo, sem experiência sólida. Talvez meu esforço durante aqueles longos meses tenha contribuído para que ele continuasse sentindo pena e compaixão das pessoas.
Todas as noites, depois do árduo expediente, tinhamos que limpar a casa toda. No posto de garçom era minha obrigação limpar as mesas, levantar as cadeiras, varrer o chão, esfregá-lo e depois abaixar todas as cadeiras. O processo era longo e cansativo, mas logo me acostumei e o fazia com rapidez e qualidade. Com a casa vazia era possível, finalmente, depois de tantas horas focado, relaxar um pouco, jogar conversa fora e até, por que não?, cantar e dançar um pouco enquanto varria. Uma das sub-gerentes, uma australiana de cabelos coloridos e não mais que 17 anos, costumava colocar música para nós nessa última hora de trabalho. Um bonito ato de misericórdia do qual nunca esquecerei. Foi ela quem tocou Little Talks. Por alguma razão, aquelas cornetas, aqueles gritos ("Hey!") e aquele refrão me traziam um certo conforto e orgulho, como o de um soldado após uma dura batalha e que ainda pode respirar livremente. Era mais um dia de luta vencido, mais um dia sobrevivido no exterior. Motivo de celebração. Eu ouvia aqueles versos suaves na voz da vocalista islandesa Nanna Bryndís, duetando com o guitarrista Ragnar Þórhallsson - dois moleques e, como a sub-gerente, novos demais, bons demais - e, de alguma forma inexplicável, me sentia feliz e vivo. A conversa fiada, assim como na letra da canção, tornava-se algo de importância vital depois de um dia em silêncio, dizendo apenas "sim, senhor", "obrigado, senhor". Little Talks transmitia em um ritmo glorioso e inspirador, nada mais do que a boa e velha esperança na vida. É por isso que a ofereço a você, fiel leitor, no último post do ano. Que 2015 te traga esperança. E que você faça o melhor com ela ;)
Feliz Ano Novo. Que 2015 traga muita alegria e conversa fiada com os amigos!
PS: Por favor, veja o vídeo da música acima. É uma coisa bela e rara.
Mais um ano que acaba e deixa saudades por tantas aventuras, viagens e músicas que conhecemos e compartilhamos. 2014 foi o ano em que voltei pra casa depois de uma grande aventura ao redor do mundo, por isso gostaria de encerrá-lo com essa canção que conheci lá, no lado oposto do globo, e me acompanha até hoje quando quero relembrar dos melhores e piores momentos vividos ali. É da banda Of Monster and Men e foi lançada em 2011 em seu álbum de estréia, "My Head is an Animal". Segue a letra:
Little Talks
(Hilmarsdóttir/Þórhallsson)
Hey! Hey! Hey!
I don't like walking around this old and empty house
So hold my hand, I'll walk with you, my dear
The stairs creak as you sleep, it's keeping me awake
It's the house telling you to close your eyes
Somedays I can't even trust myself
It's killing me to see you this way
'Cause though the truth may vary
This ship will carry our bodies safe to shore
Hey! Hey! Hey!
There's an old voice in my head that's holding me back
Well, tell her that I miss our little talks
Soon it will be over and burried with our past
We used to play outside when we were young
And full of life and full of love
Somedays I don't know if I am wrong or right
Your mind is playing tricks on you, my dear
'Cause though the truth may vary
This ship will carry our bodies safe to shore
Hey!
Don't listen to a word I say
Hey!
The screams all sound the same
Hey!
Though the truth may vary
This ship will carry our bodies safe to shore
You're gone, gone, gone away; I watched you disappear
All that's left is a ghost of you
Now we're torn, torn, torn apart, there's nothing we can do
Just let me go; we'll meet again soon
Now wait, wait, wait for me, please hang around
I'll see you when I fall asleep
Hey!
Don't listen to a word I say
Hey!
The screams all sound the same
Hey!
Though the truth may vary
This ship will carry our bodies safe to shore
Don't listen to a word I say
Hey!
The screams all sound the same
Hey!
Though the truth may vary
This ship will carry our bodies safe to shore
Though the truth may vary
This ship will carry our bodies safe to shore
Though the truth may vary
This ship will carry our bodies safe to shore
Dê o play e comece a viagem:
Vamos à andança...
Arrumar emprego em outro país não é uma tarefa fácil. Nos filmes que vemos parece tão simples chegar em outra cidade, outra cultura e ser logo absorvido pelo povo local graças ao seu charme irresistível. Infelizmente, na vida real, como sempre a coisa é diferente, um tanto menos romântica, mas nem por isso menos emocionante. O fato é que ninguém está preocupado com o seu sorriso e o seu bom humor. O que querem mesmo é alguém que trabalhe bastante, ganhe e pouco e reclame nada. Na verdade, mesmo aceitando tudo isso ainda é difícil. Candidatos são o que não faltam. Depois de muito tempo vivendo por lá e analisando os casos dos meus colegas, descobri que o emprego em outro país depende 50% de contatos, 50% de sorte. Nada mais. As habilidades e o fato de falar bem o idioma local são, por incrível que pareça, nada relevantes. Vale mais a pena ter um amigo que te indique na cozinha do bar do que ter uma boa noção de culinária. Vale mais a pena buscar o trabalho bem no dia que o chefe está desesperadamente precisando de um faxineiro do que mostrar que seu inglês é de nível profissional num dia normal. Reparei que para quem vem de um país de língua inglesa nativa a coisa é bem mais fácil. Afinal, o melhor jeito de oferecer a cara de pau e sorriso sedutor ao patrão é falando a mesma língua que ele. Para nós, órfãos de Portugual e seu bonito idioma, resta contar com a estatística acima: contatos e sorte. Conto sobre tudo isso para que seja possível compreender o quão difícil foi arrumar meu primeiro emprego fixo de garçom na Austrália e o quanto tive que agradecer à Deus por isso. Levei mais ou menos dois meses fazendo pequenos bicos para ser chamado para uma entrevista de garçom num café em uma praia distante. Na ocasião, o indonésio dono do estabelecimento me perguntou sobre experiência e estudos. Disse que vinha fazendo uns bicos na área, o que era verdade e que tinha estudado marketing no Brasil, o que julguei ser relevante. Não sei se ele acreditou ou não ou o que ele viu em mim ou não, mas gosto de pensar que ele sentiu pena. Penso se ele não me olhou nos olhos e viu, por trás da minha máscara colorida, um coitado imigrante desesperado por trabalho. Gosto de pensar assim pois então posso cluncluir que ainda há pena no mundo. As pessoas ainda oferecem ajuda aos outros por compaixão e o fazem sem esperar nada em troca. Não sei porque ele me contratou, mas foi o que ele fez. Trabalhei ali por quase tanto tempo quando meus empregos no Brasil e cada dia que o fiz, tentei fazer com o máximo de alegria. Tinha que compensar a arriscada escolha do chefe. Não é fácil dar uma chance a um cara que você nunca viu na vida, vindo do terceiro mundo, sem experiência sólida. Talvez meu esforço durante aqueles longos meses tenha contribuído para que ele continuasse sentindo pena e compaixão das pessoas.
Todas as noites, depois do árduo expediente, tinhamos que limpar a casa toda. No posto de garçom era minha obrigação limpar as mesas, levantar as cadeiras, varrer o chão, esfregá-lo e depois abaixar todas as cadeiras. O processo era longo e cansativo, mas logo me acostumei e o fazia com rapidez e qualidade. Com a casa vazia era possível, finalmente, depois de tantas horas focado, relaxar um pouco, jogar conversa fora e até, por que não?, cantar e dançar um pouco enquanto varria. Uma das sub-gerentes, uma australiana de cabelos coloridos e não mais que 17 anos, costumava colocar música para nós nessa última hora de trabalho. Um bonito ato de misericórdia do qual nunca esquecerei. Foi ela quem tocou Little Talks. Por alguma razão, aquelas cornetas, aqueles gritos ("Hey!") e aquele refrão me traziam um certo conforto e orgulho, como o de um soldado após uma dura batalha e que ainda pode respirar livremente. Era mais um dia de luta vencido, mais um dia sobrevivido no exterior. Motivo de celebração. Eu ouvia aqueles versos suaves na voz da vocalista islandesa Nanna Bryndís, duetando com o guitarrista Ragnar Þórhallsson - dois moleques e, como a sub-gerente, novos demais, bons demais - e, de alguma forma inexplicável, me sentia feliz e vivo. A conversa fiada, assim como na letra da canção, tornava-se algo de importância vital depois de um dia em silêncio, dizendo apenas "sim, senhor", "obrigado, senhor". Little Talks transmitia em um ritmo glorioso e inspirador, nada mais do que a boa e velha esperança na vida. É por isso que a ofereço a você, fiel leitor, no último post do ano. Que 2015 te traga esperança. E que você faça o melhor com ela ;)
Feliz Ano Novo. Que 2015 traga muita alegria e conversa fiada com os amigos!
PS: Por favor, veja o vídeo da música acima. É uma coisa bela e rara.
Comentários