Quando era possível ir num show de Rock...


Às vezes sinto uma certa inveja das gerações anteriores. É claro que é bom ter tecnologia e informação, mas nada disso compete com a proximidade que aqueles nascidos nos anos 60 e 70 puderam sentir com relação à suas bandas favoritas. Além de terem visto bandas lendárias lançando discos em seu auge, essas pessoas puderam também ir ao seus shows favoritos sem precisarem vender seus bens.



Infelizmente não sou velho o bastante para ter vivido o início dos anos de glória dos shows de Rock, quando era possível ir ao show do Metallica ou do Offspring pagando R$40 a inteira.

Meu primeiro show só foi acontecer em 2005, ocasião em que os Scorpions e o Nightwish (juntamente com diversas outras bandas) tocaram no festival Live'N'Louder. Paguei algo em torno de R$60, o qual pude desfrutar do merecido desconto de estudante, pois era meu primeiro ano de faculdade. Olhando hoje, pode parecer que um show deste valor fosse uma oportunidade incrível, mas a verdade é que, naquela época os preços já começava a crescer e precisei suar bastante a camisa nos meus estágios para realizar o sonho do primeiro show de Rock.

Os anos passaram. Eu saí dos estágios e fui efetivado (olha que honra!). Troquei de emprego dezenas de vezes, buscando um lugar ao sol. Mas não cresci profissionalmente na mesma potência que o preços dos concertos dos meus ídolos. Tive meus momentos de glória - um U2 em 2006, um Paul McCartney em 2010 - outros de obrigação - Deep Purple em 2008, Jack Johnson em 2014 - e até momentos, esses sim de pura oportunidade, principalmente nos shows do SESC, com ingressos por menos que R$20 e vendo bandas do calibre do Fernando Noronha e da Irmandade do Blues.

Mas foi em 2009 que eu senti que a coisa ia começar a complicar. Era o show do AC/DC. Turnê do Black Ice e o show que viria a ser meu maior arrependimento musical da vida. Os preços absurdos (lembro que já passavam dos R$300) e o mercado negro de ingressos não só acabaram com o sonho de muita gente de ir ao Morumbi ver Angus Young e sua turma, mas anunciavam uma triste verdade para os fãs do Rock: show se tornaram uma fonte de dinheiro fácil para as organizadoras.

Angus Young, anunciando o Apocalipse dos shows de Rock

A receita era simples. Um ou dois nomes famosos internacionais e uma dose de marketing eram capaz de encher um estádio. O chachê dos artistas é a menor das preocupações. Diante de 70 mil pagantes, cada um consumindo em média R$200 você tem aí quase 15 milhões de faturamento.

A partir daquele fatídico 2009, o valor dos ingressos dispararam mais rápido que notícia ruim.

Para se ter uma ideia, neste ano de 2015, os preços chegaram a R$350 no Rock in Rio e R$700 no Monsters of Rock. Há quem diga que, por se tratar de um festival, os preços são até que justos (!) uma vez que várias bandas vem no pacote. Se são todas bandas boas ou não, já é outra história. Analisemos então os shows individuais. Foo Fighters tocou aqui por R$350 e o Pearl Jam virá, em novembro, pelo mesmo valor. Imagina o quanto cobrarão caso o ACDC retorne? Meu palpite é de R$600 pra cima.

E isso com o país em crise.

Mas não há do que reclamar, certo? Os ingressos sempre esgotam. Os estádios enchem. Os artistas lucram. As organizadoras nadam no dinheiro e ninguém se importa com o chororô dos fãs que ficaram de fora. Se eram eles os fãs de verdade, que compraram camisetas pretas na adolescência com as caras da banda estampada, que trabalharam duro pra comprar a primeira guitarra e conseguir finalmente tocar aquele riff lendário ou que gastaram as economias para ter todos os discos do grupo na prateleira, pouco importa.

À esses só resta acreditar na profecia do Mestre Thomas, de que, ao passo que as bandas lendárias se aposentarem, os shows grandes uma hora vão acabar e as organizadoras vão precisar buscar outras formas de manter a fortuna que não explorando amantes da música.

E resta também, como ensina Jack Johnson, relembrar, ainda que por alguns segundos, quando a vida era mais simples e apaixonada. Quando era possível ficar horas na fila do posto de venda, mas ainda assim pagar um preço honesto pelo tíquete. Quando dava pra chegar um dia antes do show para ser o primeiro a entrar e ficar na grade - sem os empecilhos da pista VIP pra te atrapalhar - ou quando era permitido subir nos ombros dos amigos, gritar como um louco até perder a voz e, com sorte, tocar na mão do vocalista, pegar uma baqueta no ar, se emocionar e viver uma noite como se fosse um sonho para, depois de tudo, voltar à pé pra casa anestesiado com a experiência e absolutamente despreocupado com qualquer coisa, afinal nada mais importa uma vez que você já viveu o suficiente para ver seus ídolos no palco ;)

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